quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Pessoa, uma pessoa.


Hoje me peguei pensando em como eu desejaria ser uma pessoa como você. Não sou tão boa, não sou tão aberta a amar, embora o queira. É engraçado como chega a ser contraditório. Freud fala das pulsões no ser humano, pulsão de vida e pulsão de morte, que diz que todos nós fazemos involuntariamente, um movimento para morte, ao passo que investimos na vida. O inconsciente, que é o pilar central da psicanálise, aponta aquilo que o ser humano mais é, contraditório, por natureza. Outros filósofos como Nietzsche, por exemplo, já falaram disso. Então, vida e morte, querer e não-querer, está tudo atrelado. Na teoria é tudo lindo, agora na prática, na vivência, é muito, é sofrimento, é ser, humano.
Relação a dois é isso, entrega e recolhimento, então nós temos que saber que nos atiramos casando algo que nos pertence, que somos nós mesmos. E algum tempo depois chega à hora de reaver o "objeto" ou parte da gente entregada, faz parte do jogo, isso é doloroso, mas é, e pronto. É como aquela musica de Chico "te dei meus olhos pra tomares conta, agora conta como hei de partir" e tal, e tal. Mas dá uma idéia de algo que foi entregue ao outro e que agora está como perdido, mas não se perdeu. É que sofreu mutação, porque quem entrega algo, algo também recebe, nem que uma falta pra procurar tamponar. Desejo pra você, movimento. Essa palavra é muito.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Terra das manhãs nubladas.


Querido Joshua, venho por meio desta carta contar-lhe das coisas e cores. Hoje tive o prazer de apreciar o pôr-do-sol de cima de uma montanha, o céu estava tão bonito. De lá de cima eu pude observar algumas árvores. O cenário se tornou uma mistura de ocre, vermelho, verde entristecido pelo cinza, de traços negros que cercam os contornos produzindo uma sensação de calma e leveza, e ao mesmo tempo de angústia e infortúnio. Não pude deixar de lembrar de você, afinal você tem a mistura de cores que eu preciso. Sou uma mulher de paixões, capaz de, e sujeita a fazer coisas mais ou menos insensatas, das quais às vezes me arrependo mais ou menos. Muitas vezes me ocorre falar e/ou agir depressa demais. Acredito que as pessoas possam cometer semelhantes imprudências. Eu te via partir para o trabalho 07h00min da manhã, não exatamente. Eu levantava só pra me certificar que você ia se alimentar bem. Depois voltava a dormir sorrindo e pensando no quanto era bom fazer parte da tua vida lá na terra das manhãs nubladas. Através de você, pude pensar no azul do céu antes de dormir. E quando eu terminava minha prece, eu podia ver você dormindo exausto. Eu te queria sempre mais e mais e ainda mais. Eu que sempre fui regrada, tive que eclipsar-me decerto a contragosto. E na despedida eu pude ver nos teus olhos, cor de lama, que terminava ali. E assim foi. Essa última semana foi exaustiva para mim, eu adoeci e tive que tomar remédios piores que a doença. Eu precisei. E nesse meio tempo voltei a enxergar as cores menos vivas. Posso ver nitidamente o meu rosto pálido. Eu só queria você perto de mim, por algumas horas? Por todo o tempo. Eu não tenho filosofia, acredito que ter uma é estar limitado a não conhecer muita coisa, e lhe digo, ter uma paixão é estar vivo e não apenas existir. Desejo que passe por essa vida e sinta o seu coração espremido, batendo mais forte. Como se seus órgãos sumissem por alguns segundos acarretando uma falta de léxico momentânea, reafirmo: É estar vivo! Não me sinto fraca, pelo contrário... ”Eu quero o lirismo dos loucos...” já dizia o poeta do qual não recordo o nome agora. Seria estranho se eu dissesse que sinto a sua falta? “Menos cor e mais quem”.

sábado, 31 de outubro de 2009


Certa noite acordei de sonhos intraquilos. Era como se existisse um mundo sobre minha cabeça, onde se podiam ouvir vozes das quais não se entendiam muita coisa de concreto. Passos apressados. Uns por motivo de dança, outros de casais procurando a cama mais próxima. Ouvia-se o desespero no coração das pessoas. Algumas riam em função de esconderem a dor que estavam sentindo, outras choravam por amores que se obstruíam naquele momento. Eu era uma delas. Levantei atordoada com a campainha que tocava, era apenas um amigo bêbado procurando abrigo. Em seguida desistiu, resolveu dormir na sua própria casa. Saiu caminhando desajeitado pelas ruas, o observei da varanda até o perder de vista. A penumbra da luzes laranjadas dos postes entrava pela janela da sala. Uma leve garoa batia do lado de fora do vidro da janela. A noite estava fria, o vento entrava forte e gelado pela varanda. Segui pelo corredor escuro em direção ao meu quarto. Passei em frente à primeira porta, estava fechada. Não me interessava saber o que havia dentro. Chegando à segunda porta, tive a esperança de ouvir uma respiração forte. Eu queria olhar e ver um corpo inerte, seminu, coberto apenas por um edredom mala banhado. Não havia nenhum sinal de Joshua. A cama estava intacta e os lençóis em perfeito estado, como se tivessem sido postos naquele momento. Seu violão estava sobre a cama. Recobrei os sentidos e voltei a ouvir os passos no andar de cima. Adentrei no quarto. Pude observar que a janela estava aberta, facilitando a propagação dos sons e luzes das ruas permitindo que eu pudesse ver a cômoda com os papéis, desenhos e pertences de Joshua. Havia alguns quadros na parede esquerda. Sentei-me sobre sua cama, enrolei o edredom como um grande manto. Eu chorei. Depois de algum tempo resolvi levantar. Liguei o computador. Coloquei uma música ao volume baixo. Entre soluços e lamentos, dormi. Quando os primeiros raios solares entraram pela janela pude ver seu rosto, claro, sem expressão. Nossos olhos não se fitaram. Eu só queria ir embora... Eu o fiz.